Trabalhadores revelam marcas da crueldade em fazendas do MT

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Alojamento em péssimas condições de higiene
Alojamento em péssimas condições de higiene

Diário de Cuiabá

Resgatados lembram os dias que viveram em ambientes insalubres, sem água potável e com alimentação escassa nas fazendas do patrão

No estado que ocupa a posição de vice-campeão em número de trabalhadores explorados em condições análogas à escravidão, os relatos e os registros fotográficos impressionam pela crueldade do tratamento oferecido a seres humanos.

Ser obrigado a dormir dentro de fornos ou em barracos de lona, sem cama, sobre as próprias roupas surradas, que muitos chamam trapos, parece pouco. Sim, muito pouco, se comparado aos locais de onde retiram a água de beber, usam como sanitários ou a “cozinha” em que preparam os alimentos.

Nos últimos cinco anos, entre 2008 e 2012, pelos menos 1.200 trabalhadores foram regatados em propriedades rurais mato-grossenses, nas quais estariam sendo submetidas ao trabalho escravo, conforme dados do Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo em Mato Grosso, serviço da Superintendência do Ministério do Trabalho(STRE).

O pior é que dentro dessa lamentável realidade são os trabalhadores que sentem vergonha da condição em que viviam. A maioria evita falar ou vincular a imagem ou nome a esse passado que, como é de se imaginar, fazem questão de esquecer.

Mesmo depois de superar a condição de miséria em que vivia, passar pelo processo de alfabetização e ser inserido no mercado de trabalho formal, com carteira assinada e salário em dia, C.R.P., de 35 anos, não quer aparecer.

Ele contou que passou quase um ano trabalhando em uma fazenda, no interior do estado, desmatando floresta para a formação de pastos. Na época, entre 2008 e 2009, morava em um barraco no meio da mata e bebia água do riacho que era pisoteado pelos animais da propriedade.

Já os alimentos vinham do armazém de uma cidade próxima, comprada pela pelo capaz da fazenda e revendida aos trabalhadores.

“Nossa dívida não acabava nunca e o salário não cobria os gastos!, recorda. Oriundo do Maranhão, C.R. diz que o tempo todo sem dar ou receber notícia da família.

Resgatado em uma operação com auditores fiscais do Trabalho e policiais, ele aceitou a proposta para se capacitar para uma nova profissão, trouxe a família para Mato Grosso, mulher e dois filhos, e atualmente, trabalha como pedreiro autônomo.

Aos 55 anos, o pernambucano Manoel Nascimento orgulha-se das próprias conquistas desde que saiu da condição análoga à escravidão. A mais recente, a aquisição da casa própria, mesmo que financiada, a primeira de sua vida.

Ele foi resgatado há quase dois anos de uma usina de álcool, onde havia meses que não recebia salário e vivia em um alojamento em condições precárias.

Lá, além de não haver condições dignas de abrigamento e nem banheiro, faltavam alimentos. As atribuições, porém, eram excessivas. Ele diz que trabalhava em média 12 horas por dia.

Manoel ainda não recebeu direitos trabalhistas porque a ação reivindicatória ainda tramita na Justiça.

Manoel, que atualmente é um dos operários da Arena Pantanal, o estádio que sediará jogos da Copa de 2014, fala com entusiasmo do novo emprego.

Além de direitos respeitados, considera um privilégio participar dessa construção. Algo que carregará para sempre em sua história de vida. Ou seja, a vida dele tem passagem triste, mas suas conquistas falam mais alto.

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